domingo, 30 de agosto de 2009

Acho que vou te convidar de novo

Eu não sei por que motivo você não aceitou meu convite para ir ao cinema. Quando lhe chamei, nem tive assim tanta vergonha, estava mesmo decidida a dividir uns momentos sozinha e talvez até deixasse algum romantismo fluir, muito embora soubesse que nenhum de nós é muito afeito a mel de amor.

Mas até que eu estava disposta a pedir que segurasse a minha mão por conta do frio, na sala do cinema simples que tem por aqui. Pura cena, já que tenho sempre as extremidades muito frias, até mesmo no calor que a nossa cidade inventa de fazer no inverno. Queria mesmo um climazinho mais intimista pra te conhecer mais um pouquinho, já que nossa troca de olhares e encontros em festas nunca explicaram o mistério que nos ronda.

Chego até a pensar que você pode ser parecido comigo. Esse negócio de ficar em casa enquanto todos os amigos estão curtindo as festas mais badaladas do ano, ou a pouca empolgação pelas coisas que até nos interessam. Um certo desapego generalizado. Problema é que, no fim das contas, eu sou sempre mais exagerada. E só por ser assim, é que me meto a viver experiências conscientemente porque a questão de ser é subjetiva demais pra desmistificar com planos racionais bem elaborados.

Até que com você não pensei muito. Nem quando ousei provocar seu desejo naquela festa, nem quando te convidei pro cinema. Duvido que não tenha querido ir. Duvido mesmo! Mas por que não me ligou confirmando, ai eu já não sei. Tem horas que a gente prefere não ter vontades, é bem capaz de você ter simplesmente ignorado a vontade de me ligar. O telefone deve ter ficado ali, como se tivesse olhos pra você, só que você é como eu, prefere olhar a ser olhado.

Ai fica difícil, porque quando for sua vez de me convidar, e se eu atender o telefone a tempo, - porque já não o atendi outras vezes -, é bem provável que eu invente que tenho estudos atrasados, quando já li e reli todos os livros recomendados pra prova da semana que vem. Tenho essa mania boba de me manter no mesmo lugar por um período fora do comum. Em outras palavras, esse jeito feio de nunca me perder. Vai que eu me perco mesmo com você.

Imagine! Os filmes, livros e casos de amor já fizeram o favor de incutir em minha mente que só se perde por paixão - em todas as interpretações -, e esse é um aspecto que não nos envolve. Mesmo porque, muito ignóbil pra nossa natureza pacata e serena. Bobão. Ficar em casa era tudo que eu queria. Se invertesse os papéis se aproveitando da minha ideia, eu iria pra sua, assistir filme locado, com as mesmas mãos frias e a mesma vontade de pedir calor.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Eu não ligo

Eu não gosto dos teus amores! Já deveria ter lhe dito isto antes, mas eu sempre fico emudecido diante dos teus discursos filosófico-sentimentais, querendo achar argumento certo pra te convencer a ser só minha. Mas nada. Não me vem nada à cabeça que possa lhe tocar o coração. Por certo, qualquer coisa que eu dissesse você transformaria em poesia lírica e eu, tomado de encanto, embasbacado, apenas fingiria ter raiva de você, por parecer brincar com tudo que é meu.

Não é você que tenho vontade de esganar, muito embora essas tuas saias de pregas me incomodem quando passeamos. Sempre peço pra que vista uma coisa mais comportada, mas - diabos! - você adora ter as pernas à mostra e o ventinho com a sensação de uma liberdade que faz questão de expressar. É um saco ouvir dos outros que você parece atiradinha e brigar por isso.

Ainda assim, não me aguento e te chamo sempre pra sair. Eu nem ligo de você passar a metade do passeio falando dos casos que aconteceram no período que não nos falamos, manifestando opiniões sobre os romances dos amigos que você aconselha e, quase sempre ainda tenho que te dividir com as ligações que não param se eu não desligar teu telefone.

Queria não desgrudar de você, mas até que gosto de ficar só te observando correr na minha frente pra ver mais uma saia numa vitrine qualquer, ou quando dá os conselhos pelo telefone depois de ter ouvido lamentações, mordendo os lábios cheia de preocupação, ou ainda quando me puxa pela mão com pressa para entrar na fila do sorvete.

Ainda bem que eu não tenho o número do teu telefone. Ia querer ligar a todo momento pra ouvir essa sua voz de quem acaba de acordar, e tentar imaginar com que roupa está vestida sozinha em casa, tomando um daqueles chás que te deixa um gosto na boca que eu detesto. Sorte a minha ter tido o celular roubado no dia em que te conheci, sorte a minha você ter tido medo e pedido pra eu te acompanhar até em casa.

Desde então, passo ao menos uma vez por semana pra te levar pra sair. Lembro da vez que tive que viajar a trabalho e não gritei teu nome pra que aparecesse da janela. Fingi ter tido um pesadelo por ter acordado os colegas com quem dividia o quarto. O vizinho de baixo do teu prédio já nem liga mais pros meus berros, e só resmunga "pra que existe interfone?". Ele não sabe que eu adoro o teu nome, e que preciso gritá-lo de vez em quando pra que deixe de martelar em minha cabeça o tempo todo.

Desce menina, hoje é dia. Vem sair comigo. Veste algo mais decente que a gente vai prum lugar diferente dessa vez. Lá já tem sorvete e até algumas saias suas. Vem. Quero te levar pra morar comigo.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Sufocamento

Ali, tão perto. Controlei a respiração, absorvendo pequenas moléculas de oxigênio aos poucos, como se estivesse me faltando ar, apenas para não inspirar sequer uma molécula do seu cheiro que vinha do outro lado da rua. Se eu suspiro por um momento, num vacilo, correria o risco de, mais uma vez, ficar impregnada de você e não o quero mais entranhado em mim, nem mesmo naqueles sonhos calientes em que, alheia a minha razão, meu corpo pode controlar a minha alma.

Sempre sei quando está por perto, embora nunca o veja, como daquelas cousas que os olhos não veem, e o coração pressente, ou daqueloutras em que um sentido é compensado pelo outro. Talvez por isso o coração já não pulse como antes, nem volte aos tempos das pulsações inquietantes, por tantos encargos que os cinco sentidos comuns tenham lhe confiado, ao me desenganar.

Saída do engano, guardo a mera idéia das sensações que revivi, ao abrir o frasco de perfume na minha mente. Agora, nem quando quero, posso sentir. E a recíproca, absolutamente verdadeira, por falta de um triz, não fecha as minhas pálpebras num desmaio por sufocamento.

Deixe que as suspeitas recaiam sobre o peito por conta dos pulmões. Guardo comigo, nas vias vermelhas, toda essa falta de a - r.